Ação de Revisão de Cláusulas para o Equilíbrio Contratual c/c Repetição de Indébito c/c Consignação Insidente c/c Pedido Liminar

26-05-2011 21:29

 

 

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____  VARA CIVEL DA COMARCA DE JOINVILLE-SC.

 

 

 

                                               FULANO DE TAL, nacionalidade, estado civil, profissão, com R.G. nº ________ e inscrito no CPF/MF sob o nº ______________, com endereço sito à Rua _________, nº ____, Bairro ______, na cidade e Comarca de Joinville-SC, através de sua abaixo assinada inscrita na OAB/SC sob o nº 19.436, vem respeitosamente à elevada presença de Vossa Excelência, propor a presente:

                               

AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS PARA O EQUILÍBRIO CONTRATUAL c/c REPETIÇÃO DE INDÉBITO c/c CONSIGNAÇÃO INCIDENTE c/c PEDIDO LIMINAR

 

                                      Em face de:

 

                                      BANCO FULANO DE TAL, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o nº __________, podendo ser intimado na Rua __________, nº ______, Bairro ______, CEP ________, na cidade e Comarca de Joinville, pelos fundamentos de fato e de direito que passa a expor:

                                               OS FATOS

 

                                      O autor firmou com a ré contrato de arrendamento mercantil, em ____/_____/_____, sob o número __________ (documento anexo), cujo valor importava em R$ 42.000,00 (quarenta e dois mil reais).

 

                                      Em razão da compra de seu novo veículo o autor deu como entrada o valor de R$ 20.500,00 (vinte mil e quinhentos reais), arrendando então com o banco réu, o valor de R$ 21.500,00 (vinte e um mil e quinhentos reais), assim compostos:

 

DESCRIÇÃO

Valor R$

Bem

42.000,00

Valor pago à vista

20.500,00

Valor Residual Garantido

21.499,80

Prestação periódica

187,20

Prestação VRG

358,33

Total da parcela periódica

545,53

 

                                      É importante observar que ao valor do bem, foi acrescentado um valor a título de Valor Residual Garantido, uma espécie de taxa bancária cobrada no valor de 52% além do valor do bem. Não há razões para o acréscimo deste valor sobre o valor do bem que já é devidamente corrigido e sobre o qual incide taxa de juros - que são a remuneração do capital, o lucro da financiadora. Então, além de corrigir o valor e de lucrar com ele, o banco ainda cobra um plus, com o que vem a se beneficiar ainda mais.

 

                                      Como garantia do contrato o Autor foi obrigado a emitir, em favor do requerido, uma Nota Promissória em branco.

 

                                      Inobstante o valor arrendado ser de R$ 21.499,80 e de sua divisão por 60 parcelas resultasse em prestações de R$ 545,53, a primeira de sessenta parcelas pactuadas foi estipulada em R$ 550,03, como consta no boleto, com data inicial prevista para 28/02/2008. A prestação efetiva, contudo, foi exigida no valor de R$ 550,03, ou seja 53,50% a mais, incluído aí R$ 4,50 de tarifa de cobrança bancária.

 

                                      Já o Valor Residual Garantido, correspondente a 52,24% do valor total do bem, que foi parcelado em sessenta vezes. Os pagamentos estão registrados na cópia da do carnê bancário emitido pelo requerido, que vai anexa à presente.

 

                                      O requerente pôde suportar regularmente o pagamento das primeiras treze parcelas, porém a cada mês vem atrasando mais ficando insustentável sua situação.

 

                                      Note-se que ainda não se está tratando de multas ou juros de mora, Excelência, mas apenas de correção monetária, já que até a décima terceira prestação não houve qualquer inadimplência.

 

                                      Quanto aos juros de financiamento, estes já vieram embutidos no preço final, como se observa pela diferença entre a simples divisão do valor total pelo número de parcelas e o valor arbitrado para as parcelas:

 

VALOR ARRENDADO 60 PARCELAS

R$ 358,33

VALOR DA PARCELA NO CONTRATO

R$ 545,53

DIFERENÇA

R$ 187,20 (52,24%)

 

                                      Assim, já se constata, nas primeiras trez parcelas, a aplicação de juros na ordem de 52,24%, quando se sabe que os juros contratuais não leoninos giram normalmente, no mundo dos negócios honestos, a 1% por mês, enquanto a correção monetária não ultrapassa o índice inflacionário, à altura média de 1% mensal. Isto sem considerar o valor residual garantido. Um disparate.

 

                                      Como qualquer pessoa física brasileira, não tem mais o Autor condições de resistir ao desproporcional valor das prestações. Por ocasião da 13ª parcela não é mais possível arcar com a carestia, situação que perdurou até o vencimento da 13ª, em março de 2009.

 

                                      Mesmo com dificuldades o requerente honrou suas obrigações contratuais até a 13ª prestação do parcelamento, quando então não conseguiu mais suportar o valor das parcelas.

 

                                      Diante da incômoda situação de inadimplência que irá se tornar, o requerente pleiteia a renegociação da dívida, ou seja, a revisão do contrato, e a conduta do requerido face ao sabido caráter imoral do contrato revelou-se claramente quando calculado o valor de juros atribuídos ao valor original financiado.

 

                                               O DIREITO - O FORO DE ELEIÇÃO

 

                                      Está cristalizada na doutrina e na jurisprudência a veemente repulsa às cláusulas abusivas de eleição do foro. O que deveria ser uma deliberação conjunta visando facilitar a resolução de divergências, passa à decisão unilateral mascarada pelo típico formato inextricável dos contratos de adesão, como o que originou esta lide.

 

                                      Não vai além de artifício sutil para obstaculizar e restringir a possibilidade de defesa de um possível contratante prejudicado. É estratégia, meritíssimo, e das rasas. Coisa descabida entre probos.

 

                                      Numa relação contratual, a cláusula em questão é tida como leonina, e proporciona vantagem excessiva para uma parte em detrimento de outra. O bônus auferido pelo contratante favorecido é tamanho que o ônus do outro chega a se transmudar em efetivo dano aos seus direitos fundamentais.

 

                                      O foro de eleição disposto com má-fé no contrato de adesão é cláusula abusiva, como se infere no Código de Defesa do Consumidor, que no seu artigo 51 expressa:

"Art.51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; [...]

§ 1º - Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:

III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e o conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso. [...]"

 

                                      Em concordância à predominante doutrina, vastíssima é a jurisprudência que elucida o caso como, dentre inúmeras, as seguintes:

 

"Em contrato de adesão, a cláusula de eleição de foro deve ser interpretada em favor da parte aderente, independente de se tratar de pessoa física ou jurídica, sendo considerada abusiva na hipótese de acarretar-lhe exagerado ônus, de conformidade com a regra do artigo 51, parágrafo 1º, inciso III, da Lei 8.078/90 [...]" TAMG, 3ª C.Civil, AI 169506-3, j. em 23.02.94, rel. Juiz Guimarães Pereira, v.unânime, RJTAMG 54-55/98-100.

 

"[...] Ora, não se nega que a faculdade de eleição de foro no contrato continua válida, dentro dos princípios do art. 42 do CC. Porém, essa eleição nos contratos de massa, contratos de cláusulas predispostas ou contratos de adesão (definido pelo art.54 do CDC), como ocorre nos contratos de consórcio, pode se afigurar abusiva, se, na prática, dificultar ou impossibilitar a defesa do consumidor. Cuida-se da aplicação do princípio da boa-fé nos contratos, aliás não desconhecido pelo legislador de nosso Código Civil. Nesse sentido, diz a lei sob exame que dentre as cláusulas nulas de pleno direito incluem-se aquelas que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade (art.51, IV) [...]" 1º TACSP, 5ªC, MS 568462-0, j. em 24.11.93, rel. Juiz Sílvio Venosa, v.unânime, RDC 13/173-174.

 

                                      Muito vago o artifício revestido pela cláusula de eleição do foro, implica no apequenamento da parte aderente, o que lhe impõe sério dano ao próprio direito material que deveria ser resguardado pelo contrato. A referida disposição gera, de plano, a nulidade da cláusula, que embora não resulte na nulidade do contrato como um todo, permite transferir a competência de foro ao domicílio do autor.

 

                                               O ABUSO DO PODER ECONÔMICO

 

                                      Pelo que se infere facilmente dos fatos narrados, o requerido usa e abusa de sua superioridade econômica para extrair do autor mais até de que seu dinheiro. Extrai-lhe também a dignidade; a convicção na decência e na moralidade; extrai-lhe a confiança nas instituições e a esperança nos ideais de honestidade comercial. Não há mais dúvidas - e isto está abundantemente dito na doutrina e na jurisprudência - sobre a iminente abusividade de instituições financeiras que avançam sobre o patrimônio de pessoas físicas sob a capa da liberdade contratual e do pacta sunt servanda.

                                      Neste caso, nasce o abuso com o próprio contrato de adesão, que embute em suas minúsculas letras uma gama de responsabilidades restritivas para o aderente, outra leva de opções facultativas à arrendante, criando uma relação análoga à dos senhores feudais com seus vassalos. Aí se contém, verbi gracia, a estipulação da taxa de juros, que está oculta no contrato original mas confessada no aditivo:

 

"redução da taxa de juros de 48% a.a. para 35% a.a. ..."

 

                                      Recomenda-se, meritíssimo, uma leitura minuciosa de todo o teor do contrato em questão: há de se verificar o quão exploradora pretende ser a arrendante, desde a imputação de todas as possíveis e imagináveis responsabilidades ao arrendatário até a exigência de submissão desta, ao livre controle daquela em toda a sua vida mercantil, sem contar a isenção de garantias e responsabilidades do arrendante e a imposição de todas as despesas, de qualquer natureza, às custas, claro, do arrendatário.

 

                                      Muito distante da publicidade e dos sorrisos que seduzem o consumidor, a efetivação do negócio se transforma numa armadilha - escondida sob o contrato de adesão - que acaba por dilapidar o seu já escasso patrimônio. É assim que enriquece rapidamente a instituição. É assim que o seu poderio econômico invade nocivamente a economia popular.

 

                                      E é justamente com base nesta conduta que o requerido-arrendante provoca, desde o princípio, um escancarado desequilíbrio contratual. Como já ressalvado, alguns valores apresentados são aproximados em virtude da negativa do requerido em fornecer imediatamente informações decorrentes do contrato para o próprio contratante. Nítida a má-fé. Ainda assim é possível concluir facilmente a desproporcionalidade dos reajustes e dos juros cobrados.

 

                                      O bem objeto do contrato recebeu uma valoração de R$ 11.502,00 (onze mil quinhentos e dois reais), esse valor sem o seguro. Sem contar juros nem correção, a primeira parcela deveria ser eqüivalente a R$ 358,33. Foi, no entanto, já no contrato, de R$ 545,53, o que representa uma majoração de 52,24%. E na efetiva cobrança, passou para R$ 550,03, num acréscimo de 53,50%. Isto entre a assinatura do contrato e a primeira parcela!

 

                                      A situação é absurda. Do valor inicial, o requerente já pagou R$ 7.150,39, esse valor sem contar a multa e a mora devido aos atrasos, pois conforme os valores pagos no carnê bancário, alcança o montante de R$ 7.659,75, e ainda deve - segundo o arrendante - R$ 25.851,41. Não é preciso ser exímio contador para verificar a extravagância.

 

                                      Está-se, pois, diante de uma relação de abuso no contrato, em que figuram cumulativamente o anatocismo, os juros excessivos, a correção monetária ilegal, a cobrança indevida e, por tudo, o desequilíbrio contratual.

 

                                               O ANATOCISMO

 

                                      A figura do anatocismo, capitalização dos juros, é absolutamente rechaçada pela lei:

 

"É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada”. Súmula 121 do STF.

 

"É proibido contar juros dos juros; esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos de conta-corrente de ano a ano”. Lei da Usura, Decreto 22.626, de 7 de abril de 1933; artigo 4º.

 

                                      E esta repulsa se encontra com abundância nos entendimentos jurisprudenciais:

 

"É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada (súmula 121); dessa proibição não estão excluídas as instituições financeiras, dado que a súmula 596 não guarda relação com anatocismo. A capitalização semestral de juros, ao invés da anual, só é permitida nas operações regidas por leis especiais, que nela especialmente constem." Ementa. Recurso Extraordinário 90341/1.

 

"A capitalização de juros (juros de juros) é vedada pelo nosso direito, mesmo quando expressamente convencionada, não tendo sido revogada a regra do Art. 4º do Decreto 22.626/33, pela Lei 4.595/64. O anatocismo repudiado pelo verbete nº 121 da súmula do Supremo Tribunal Federal não guarda relação com o enunciado nº 50 e TRF/164”. Recurso Especial nº 1285 - GO, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo.

 

"... a capitalização de juros é vedada, mesmo em favor das instituições." RTJ 92/1.341, 98/851, 108/277, 124/616; STF - bol AASP 1343/218.

 

"Embargos à execução. Excesso de Execução. Juros infringentes. Lei da Usura. Desatualidade da Súmula 596. Procedência dos embargos”. Ementa da Ap.Cível 194249132, 4ª C.Cível, Arroio do Meio. Apelante Suinícola Arroio do Meio Ltda e Telmo Stacke. Apelado Banco Meridional do Brasil.

 

"A capitalização de juros é vedada pelo nosso direito, mesmo que expressamente convencionada, não tendo sido revogada a regra do artigo 4º do Decreto 22.626/33 pela Lei 4.595/64. Anatocismo repudiado pelo verbete da Súmula 121 do Supremo Tribunal Federal, não guarda relação com o enunciado 596 da mesma Súmula." Recurso Especial 1.285, 14.11.89, 4ª Turma do STJ, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, in JSTJ - TRF 6/163.

 

                                      Tendo incorrido em anatocismo, o requerido ofende aos ditames da Lei da Usura, no seu quarto artigo, e à Súmula 121 do Supremo Tribunal Federal. Mais que isso, agride ao esforço conjunto de toda a sociedade em recuperar decênios perdidos em inflação, desvalorização monetária e estagnação econômica.

 

                                      O país vem sofrendo com as dificuldades características do desenvolvimento contido e da crise financeira, e quaisquer condutas abusivas de poder econômico por parte das grandes instituições financeiras se tornam logo severos ataques ao equilíbrio social. Não apenas dos pequenos, mas principalmente dos grandes se espera postura nobre, consciente e concorde aos princípios do Direito e da Justiça que dão sentido à vida de um povo.

 

                                               OS JUROS EXCESSIVOS

 

                                               Juros reais, ou simplesmente juros, são a remuneração do capital. Longe de serem confundidos com os juros nominais, ou a correção monetária, que apenas atualiza o valor, aqueles equivalem a uma retribuição pelo tempo em que o montante ficou indisponível para quem o deu emprestado, enquanto disponível para quem o tomou.

 

                                      A Lei tratou bem deste assunto, a começar pela respeitada Lei da Usura, já em seu primeiro artigo:

 

"É vedado, e será punido nos termos desta lei, estipular em quaisquer contratos taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal (Código Civil, artigo 1.062)." Lei da Usura, Decreto 22.626, de 7 de abril de 1933; artigo 1º.

 

                                      A Constituição Federal é clara em seu artigo 192, parágrafo 3º, sobre a limitação destes juros:

 

"As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar." Constituição da República Federativa do Brasil; Artigo 192, §3º.

 

                                      Embora tenha o Supremo Tribunal Federal, na ação direta de inconstitucionalidade 004-DF, por maioria, decidido que a norma não é auto-aplicável, toda uma gama de doutrinadores, juristas, juizes, desembargadores e até mesmo Ministros da Suprema Corte têm entendido pela eficácia plena do texto, dependendo de lei complementar apenas o que se refere à punição, e sendo auto-aplicável a limitação dos juros em doze por cento.

 

                                      É farta a exposição doutrinária a respeito, como no eminente dizer do professor José Afonso da Silva:

 

"Está previsto no parágrafo terceiro do artigo 192 que as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar. Este dispositivo causou muita celeuma e muita controvérsia quanto a sua aplicabilidade.

Pronunciamo-nos, pela imprensa, a favor de sua aplicabilidade imediata, porque se trata de uma norma autônoma, não subordinada à lei prevista no caput do artigo. Todo parágrafo tecnicamente bem situado (e este não está, porque contém autonomia de artigo) liga-se ao conteúdo do artigo, mas tem autonomia normativa.

Veja-se, por exemplo, o parágrafo primeiro do mesmo artigo 192. Ele disciplina o assunto que consta dos incisos I e II do artigo, mas suas determinações, por si, são autônomas, pois uma vez outorgada qualquer autorização, imediatamente ela fica sujeita às limitações impostas no citado parágrafo. Se o texto em causa fosse inciso de artigo, embora com normatividade formal autônoma, ficaria na dependência do que viesse a estabelecer a lei complementar. Mas tendo sido organizado num parágrafo, com normatividade autônoma, sem ferir a qualquer previsão legal ulterior, detém eficácia plena e aplicabilidade imediata. [...]

Juros reais os economistas e financistas sabem que são aqueles que constituem valores efetivos, e se constituem sobre toda desvalorização da moeda. Revela ganho efetivo e não simples modo de corrigir a desvalorização monetária.

As cláusulas contratuais que estipularem juros superiores são nulas.

A cobrança acima dos limites estabelecidos, diz o texto, será considerada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei dispuser. Neste particular, parece-nos que a velha Lei da Usura (Decreto 22.626/33) ainda está em vigor." Direito Constitucional Positivo, 6ª edição, Editora LRT, 1990, páginas 694 e 695. (GRIFAMOS)

 

                                      Também não faltam exemplos dos nossos Tribunais, que assim vêm decidindo:

 

"Juros Reais. Artigo 192, § 3º da Constituição Federal. Dispositivo não sujeito a regulamentação. Aplicabilidade imediata. A remuneração do capital e a remuneração do serviço referido a concessão de crédito constituem juros reais e não podem superar a 12% ao ano. Apelação desprovida." Julgados do TARGS 76/298.

 

"Juros. Incidência de aplicação da norma constitucional limitadora. Anatocismo. Contrato de abertura de crédito em conta-corrente. Cheque forte. [...] os juros devidos, desde a vigência da Constituição Federal, são de 12% ao ano, vez que auto-aplicável a norma do artigo 192, parágrafo 3º [...]" Julgados do TARGS 81/207.

 

"Juros. Fixada a taxa de juros no limite máximo de doze por cento, em texto expresso na Constituição Federal, a redução a esse limite dos juros cobrados em operações de crédito é imposição constitucional que dispensa regulamentação para sua imediata aplicação." ADV - ADCOAS Seleções Jurídicas, dezembro de 1990, páginas 9 e 10.

"Direito Civil. Juros. Percentual acima do texto legal. Ofensa à lei de divergência com jurisprudência sumulada. Recurso Conhecido e provido. A circunstância do título ter sido emitido pelo devedor, voluntariamente, com seus requisitos formais, não elide a ilegalidade da cobrança abusiva de juros, sendo irrelevante a instabilidade da economia nacional. O sistema jurídico nacional veda a cobrança de juros acima da taxa legal. [...]

Sem embargo da referida norma constitucional ser dirigida, em especial, às instituições financeiras, é certo, contudo, que o Decreto 22.626/33 está em perfeita sintonia com aquele preceito, pois só assim serão respeitados os princípios fundamentais insertos no artigo 1º, incisos III e IV da Carta Magna" in RSTJ 4/1.462 a 1.466 - Relator Ministro Sálvio de Figueiredo.(grifo nosso) No mesmo sentido: RSTJ 10/143.

 

"[...] os juros pactuados entre as partes incidem até a data da promulgação da Constituição. O artigo 192, parágrafo 3º, da Carta da República é norma suficiente por si, auto-aplicável, não estando na dependência de regulamentação por lei ordinária. A expressão ´nos termos que a lei determinar´ transfere à legislação infra-constitucional exclusivamente a definição da ilicitude penal (crime de usura), naturalmente em respeito ao princípio da reserva legal." TAPR - Processo 0043000-4, 5ª Vara Cível, Ac. Unânime 2.921, j. 18.9.91, DJPR 11.10.91, página 48.(grifo nosso)

 

No mesmo sentido: TARGS 81/176; 81/314.

 

"Esse entendimento, fundamental é ressaltar, harmoniza-se com a terceira hipótese do parágrafo 4º do artigo 173 da Carta Magna, o qual reza: ´A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.´ Em conseqüência, todos os dispositivos e atos normativos incompatíveis com esta norma perdem eficácia, porque não podem esvaziar o seu comando, diante da recepcionalidade. [...]

Cabe, em vista dessa motivação, a ensinança de Maria Helena Diniz (Curso de Direito Civil Brasileiro, 2º volume, Saraiva, página 322, item b.6.1, nº 1) vazada nos seguintes termos: ´As partes interessadas combinam os juros pelo prazo da convenção, e se por ventura não os fixarem, a taxa será a constante da lei, desde que haja estipulação a respeito. Todavia, é preciso lembrar que o Decreto 22.626/33, parcialmente alterado pelo Decreto-Lei 182/38, ao reprimir os excessos da usura, proibiu a estipulação em quaisquer contratos de taxas superiores ao dobro legal (artigo 1º)’ [...]." Jurisprudência Catarinense 68/176-178, Desembargador Francisco de Oliveira Filho.

 

"Juros. Lei do Mercado de Capitais. Lei da Usura. Limitação Constitucional. Auto aplicabilidade do parágrafo terceiro do artigo 192 da Constituição Federal. A Lei 4.595/64 não revogou o artigo 1.062 do Código Civil, nem os artigos 1º e 13º da Lei de Usura (Decreto 22.626/33). Limitar não é sinônimo de liberar e muito menos de majorar; exegese iníqua e equivocada do artigo 4º, incisos VI e IX da Lei 4.595/64, consagrada na Súmula do STF [...]" TARGS, Ap. Cível 191.153.519 da 2ª Câmara Cível, j. 19.12.91

 

"Leasing. Indexador das prestações. Taxa e capitalização de juros. Honorários advocatícios. [...] Em se tratando de contrato firmado já na vigência da atual Constituição Federal, as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a 12% ao ano, nos precisos termos do parágrafo terceiro do artigo 192 da Constituição Federal. No caso dos autos, por não existir legislação específica que autorize a capitalização dos juros na forma pretendida pelo credor, incide a proibição contida na Lei da Usura e na Súmula 121 do Supremo Tribunal Federal." TARGS, 1ª Câmara Cível, Porto Alegre, Ap. Cível 193067691.

 

"Leasing. Reajuste das prestações e do resíduo. Limite constitucional da taxa de juros. Estabelecendo cláusula contratual a atualização do valor monetário das prestações do arrendamento e do resíduo, pelo custo da captação, expressa em fórmulas e equações complexas; sabendo-se que o mercado financeiro, seja na captação, seja na reaplicação, tem praticado taxa de juros acima do limite estabelecido no parágrafo 3º do artigo 192 da Constituição Federal; sendo o entendimento unânime da Câmara, sufragado pelo 1º Grupo Cível, que a norma constitucional acima é de eficácia plena, auto-aplicável, confirma-se a sentença que determinou a atualização pelos índices oficiais, com incidência de juros segundo o limite constitucional, não se aplicando a Lei 7.943, de 18/10/89, por ser superveniente ao contrato. Apelação não provida." TARGS, 1ª Câmara Cível, Porto Alegre, Ap. Cível 193035052.

 

"O § 3º do artigo 192 da Constituição contém norma proibitiva e auto-aplicável, sem necessitar de qualquer complemento legislativo que, se editado, deverá moldar-se à vedação constitucional, e não o contrário." RT 683/192.

 

"Juros. Limite de 12% ao ano. Incidência imediata da norma constitucional. A norma do § 3º do artigo 192 da Constituição Federal é de eficácia plena, por isso que contém, em seu enunciado, todos os elementos necessários à sua aplicação. Logo, é auto-executável, de incidência imediata”. RT 653/192.

 

"A estipulação e a percepção de juros não são contra a moral, nem contra o direito natural ou justo (conforme Chr.Fr.Schott, Dissertationes Iures Naturalis, diss. de moralitate usurarum, II, 53 S); todavia, são contra a moral e depõem contra a própria organização social os juros excessivos. [...]" Voto do Ministro Sálvio de Figueiredo; Recurso Especial nº 5 - MT.

                                      Não fosse o bastante, vale o respaldo dos próprios ministros da Suprema Corte do país, dois dos quais têm aqui o registro de seu voto:

 

MINISTRO PAULO BROSSARD

"Tenho para mim que o § 3º do artigo 192 tem em si mesmo elementos bastantes para imperar desde logo e independente de lei complementar, até porque esta, querendo ou não o legislador, não poderá deixar de ter como juro máximo 12% ao ano, incluídas nessa taxa que, aliás, não é nova entre nós, toda e qualquer comissão ou tipo de remuneração direta ou indiretamente referida à concessão do crédito. Isto porque, como é sabido, como a chamada lei de usura prescrevesse como limite máximo a taxa de juros de 12%, instituições financeiras, sob a pressão do fenômeno inflacionário, passaram a cobrar outras taxas sob rótulos distintos.

Querendo ou não querendo o legislador ele não poderá autorizar a cobrança de qualquer remuneração seja a que título for, direta ou indiretamente ligada à concessão de crédito, além do juro, juro este que será de até 12% e em caso algum superior a essa taxa." Voto do Ministro Paulo Brossard, ADI 004-DF; RTJ 147/830.

 

MINISTRO CARLOS VELLOSO

"O § 3º do artigo 192 da Constituição, Senhor Presidente, contém, sem dúvida, uma vedação. E contém, de outro lado, um direito ou, noutras palavras, ele confere também um direito, um direito aos que operam no mercado financeiro. Em trabalho doutrinário que escreveu sobre a taxa de juros do § 3º do artigo 192 da Constituição, lecionou o Desembargador Régis Fernandes de Oliveira:

´Percebe-se, claramente, que a norma constitucional gerou um direito exercitável no círculo do sistema financeiro, criador de uma limitação. Está ela plenamente delimitada no corpo da norma constitucional, independentemente de qualquer lei ou norma jurídica posterior.

Bem se vê que as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano... Segue a redação após o ponto-e-vírgula estabelecendo que o descumprimento do preceito será estabelecido em lei (ordinária, porque definidora de infração penal).

O desfrute de tal limitação constitucional àqueles que lidam no mercado financeiro (qualquer do povo) é imediato, a limitação aos que operam no sistema emprestando dinheiro é imediata. Do direito de um nasce a obrigação do outro. A relação jurídica intersubjetiva que se instaura gera a perspectiva do imediato desfrute da limitação imposta.´ (Régis Fernandes de Oliveira. Taxa de Juros, inédito. O autor enviou-me cópia do trabalho).

Contém, já falamos, o citado § 3º do artigo 192 da Constituição uma vedação: ´as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano´. Porque ela é uma norma proibitória ou vedatória, ela é de eficácia plena e aplicabilidade imediata, ou é ela uma norma auto-aplicável. E porque confere ela, também, um direito aos que operam no mercado financeiro, também por isso a citada norma é de eficácia plena. Não me refiro, evidentemente, à segunda parte do § 3º do artigo 192, que sujeita a cobrança acima do limite a sanções penais, porque esse dispositivo não precisa ser trazido ao debate.

As normas constitucionais são, de regra, auto-aplicáveis, vale dizer, são de eficácia plena e aplicabilidade imediata. Já foi o tempo em que predominava a doutrina no sentido de que seriam excepcionais as normas constitucionais que seriam, por si mesmas, executórias.

Leciona José Afonso da Silva que ´hoje prevalece entendimento diverso. A orientação doutrinária moderna e no sentido de reconhecer eficácia plena e aplicabilidade imediata à maioria das normas constitucionais, mesmo a grande parte daquelas de caráter sócio-ideológicas, as quais até bem recentemente não passavam de princípios programáticos. Torna-se cada vez mais concreta a outorga dos direitos e garantias sociais das constituições.´ (José Afonso da Silva, obra citada, página 76).

Nem poderia ser de outra forma. É que o legislador constituinte não depende do legislador ordinário. Este é que depende daquele. Então, o que deve o intérprete fazer, diante de um texto constitucional de duvidosa auto-aplicabilidade, é verificar se lhe é possível, mediante os processos de integração, integrar a norma à ordem jurídica.

Esses métodos ou processos de integração são conhecidos: a analogia, que consiste na aplicação a um caso não previsto por norma jurídica uma norma prevista para hipótese distinta, porém semelhante à hipótese não contemplada; o costume; os princípios gerais de direito e o juízo de eqüidade, que se distingue da jurisdição de eqüidade.

De outro lado, pode ocorrer que uma norma constitucional se refira a instituto de conceito jurídico indeterminado. Isto tornaria inaplicável a norma constitucional? Não. É que a norma dependeria, apenas, de ´interpretação capaz de precisar e concretizar o sentido de conceitos jurídicos indeterminados´, interpretação que daria à norma ´sentido operante, atuante´, ensina o professor e Desembargador José Carlos Barbosa Moreira, com sua peculiar acuidade jurídica (José Carlos Barbosa Moreira, Mandado de Injunção, in Estudos Jurídicos, Rio, 1991, página 41).

É o caso da ´taxa de juros reais´ inscrita no § 3º do artigo 192 da Constituição, que tem conceito jurídico indeterminado e que, por isso mesmo, deve o juiz concretizar-lhe o conceito, que isto constitui característica da função jurisdicional.

Busco, novamente, a lição de José Carlos Barbosa Moreira a dizer que ´todo conceito jurídico indeterminado é suscetível de concretização pelo juiz, como é o conceito de boa-fé, como é o conceito de bons costumes, como é o conceito de ordem pública e tantos outros com os quais estamos habituados a lidar em nossa tarefa cotidiana´ (José Carlos Barbosa Moreira, obra e local citados).

Não seria procedente, portanto, o segundo argumento dos que entendem que o § 3º do artigo 192 não é auto-aplicável: a locução ´taxa de juros reais´não teria sido definida juridicamente, o que impediria a imediata aplicação da norma limitadora dos juros." Voto do Ministro Carlos Velloso, ADI 004-DF; RTJ 147/816-817.

 

                                      Vale, ainda, por contribuição a esta causa e ao engrandecimento da labuta jurídica por qual todos passamos, aprender mais uma vez com o eminente Ministro Paulo Brossard, do Supremo Tribunal Federal, em dois de seus mais brilhantes votos, já consagrados na literatura forense nacional:

 

"Sigo fiel ao voto que emiti na ADI 4-7 em cuja linha se situam os acórdãos recorridos. Não convém que a tese caia no esquecimento e deste venha a morrer e fique sepultada definitivamente por causa de uma decisão, quando argumentos ad terrorem foram lançados, a céu aberto; o tempo mostrou a absoluta falácia do que então foi dito.

Outrossim, continuo convencido de que não há atividade lícita que suporte juros usuários que se tornaram correntes em nosso país. De modo que, com todo respeito àquela decisão, mantenho-me fiel à orientação que então externei, pois, se já estava convencido, hoje estou mais persuadido do que ontem." JSTF 188/284.

 

"Por mais respeito que deva ter ao acórdão proferido na ADI 4-7/600, a ele não posso prestar homenagem. Entre ele e o Brasil, fico com este, enquanto a usura, condenada pela Constituição no mais explícito e terminante de seus preceitos e, contudo, pimpante, gordacha, próspera e luzidia, não destruí-lo.

Em outros tempos se dizia que ou o Brasil destruía a saúva ou a saúva destruiria o Brasil. O mesmo se pode dizer da usura, ou o Brasil a destrói ou por ela será destruído. Penso que não tardará o momento em que o Supremo Tribunal Federal terá de reenfrentar a questão, que é de viva atualidade e crescente importância." JSTF 209/212.

 

                                      De todo modo, ainda que paire dúvida sobre a aplicabilidade da limitação constitucional aos juros, resta mesmo assim o caráter não-vinculativo da decisão do Supremo Tribunal Federal, como excerto do recentíssimo acórdão de nosso Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

 

"[...] Ressalta-se que a ADIN referida não tem caráter vinculativo. No caso ela foi julgada improcedente. Apenas faria coisa julgada material, vinculando as autoridades aplicadoras da lei, caso julgada procedente, declarando a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo. [...]

A propósito, adverte o ilustre professor Nagib Sailbi Filho:

´Poderá o magistrado, no entanto, até mesmo deixar de aplicar a norma declarada constitucional, desde que o faça com fundamento outro que não seja o da inconstitucionalidade da norma, como, por exemplo, o de que a norma foi revogada ou, até mesmo, que é inaplicável no caso em julgamento.

A autonomia funcional do juiz não precisa ser expressamente declarada em norma constitucional, como se vê necessário em outros países; aqui prevalece o regime presidencialista, o que, por si só, assegura a autonomia do Poder Judiciário e, conseqüentemente, a competência funcional de seus órgãos e agentes.

Pode-se dizer, até mesmo, que o juiz só tem acima de si sua própria convicção jurídica, sem prejuízo da imprescindível fundamentação de suas decisões.

Assim, ao julgar o caso concreto não fica o juiz vinculado absolutamente à decisão proferida na ação declaratória de constitucionalidade, mas tão-somente no que diz respeito à declaração de constitucionalidade da norma que seja necessária, em suas disposições, para a tramitação processual, como para o julgamento do mérito.´ (Ação Declaratória de Constitucionalidade, Forense, 1994, páginas 177/178).

De outra parte, adverte Cândido Rangel Dinamarco:

´A força que tenha a tomada de posição do juiz, ou que tenham as repetidas decisões coincidentes

(e tanto maior quanto mais elevado for o órgão jurisdicional), é mera influência moderada, ou seja, influência que não chega a caracterizar-se como poder. Decisões que contrariem a jurisprudência não são ilegítimas por essa razão e não comete desvio de poder o juiz que as profere.

O Supremo Tribunal Federal chegou inclusive a proclamar essa liberdade dos juízos inferiores e outros tribunais, o que fez em dois importantes enunciados de sua Súmula. Em primeiro lugar, disse que não constitui violação a literal disposição de lei a opção por uma entre duas ou várias interpretações que o texto legal vier recebendo na jurisprudência: o Supremo Tribunal tem por juridicamente impossível a demanda rescisória nesse caso, com o que afirma a liberdade de julgar de modo divergente da corrente dominante.

Está também assentado que não nega vigência à lei a sua interpretação razoável, ainda que não seja a melhor. Por mais que a jurisprudência influa os julgamentos inferiores, portanto, a sua infringência não é assim rigorosamente hostilizada pelos próprios tribunais.´(A Instrumentalidade do Processo, RT, 2ª ed., 1990, páginas 156/157)." TJSC; Ap. Cível 96.006262-9, j. 24.9.96, Rel. Des. Carlos Prudêncio, DJ 9645.

 

                                      Imprescindível o entendimento que segue, corroborando com a desnecessidade da auto-aplicabilidade do § 3º do artigo 192 da Constituição Federal, porque suficiente para garantir a obrigatoriedade dos juros legais, limitados em doze por cento:

 

"O dispositivo do artigo 192, § 3º da Constituição Federal não é auto-aplicável, conforme estabelecido na ADI nº 4. Todavia, isso, por si só, não implica liberação das taxas de juros. A Constituição Federal revogou a legislação anterior que permitia a fixação pelo Conselho Monetário Nacional, via Banco Central. Da conjugação dos artigos 22 e 48 da Carta, resulta que só o Congresso pode dispor sobre matéria financeira (incluídas aí, por óbvio, as taxas de juros), vedada qualquer delegação de poderes nessa matéria (artigo 68). Por outro lado, o artigo 25 do ADCT revogou expressamente, no prazo de seis meses da promulgação da Carta, toda a legislação permissivas de delegações ao Executivo. Restaram, assim, revogadas a Lei 4.595/64, nessa parte, e as resoluções do Banco Central liberadoras das taxas de juros. A matéria deveria ter sido regulamentada por lei aprovada no Congresso, e tal não ocorreu. Vigente, pois, ainda o Decreto 22.626/33 - Lei da Usura, não revogado pela Lei 4.595/64 [...]" TARGS - Ap.Cível 194232419, Sapucaia do Sul, Relator Juiz Jorge Alcibíades Perrone de Oliveira, j. 21.12.95.

 

"Juros. Embora não auto-aplicável o artigo 192, § 3º da Constituição Federal, os juros são limitados a 12%, porque a Carta revogou a delegação ao Banco Central para regular essa matéria, que hoje é de competência exclusiva do Congresso Nacional. Artigos 22, 48, 68, § 1º da Constituição Federal e 25 do ADCT. Revogada a delegação, cai por terra a legislação anterior nessa parte - Lei 4.595 e Resoluções do Banco Central, voltando a incidir a Lei da Usura, que nunca foi revogada, apenas se entendia não-aplicável. Enquanto não for editada pelo Congresso Nacional outra lei, ainda vige o Decreto 22.626/33." TARGS - Ap.Cível 195037338, de Cruz Alta, Relator Juiz Jorge Alcibíades Perrone de Oliveira, j. 21.12.95.

 

"Quer pelo entendimento de que a norma do artigo 192, § 3º, da Constituição Federal de 1988 (artigos 22, 48, 68 § 1º e 25 do ADCT) revogou a legislação anterior que permitia ao Conselho Monetário Nacional, via Banco Central, dispor sobre a matéria, os juros estão limitados a 12% ao ano, por força do Decreto 22.626/33 (Lei da Usura)." TARGS - Embargos Infringentes 195012562, Relator Juiz Jorge Alcibíades Perrone de Oliveira, j. 24.11.95.

 

                                      Ou seja, ainda que se considere não auto-aplicável a norma constitucional contida no § 3º do artigo 192 da Carta Magna, a legislação viva - e recepcionada pela Constituição - garante, por si, a limitação dos juros em 12% ao ano.

 

                                      Arrematando:

 

"[...] A limitação de juros tem razão de ser não só na Constituição Federal de 1988, mas também na legislação anterior, por ela recepcionada, principalmente artigo 1.062 do Código Civil e Lei da Usura, esta não revogada pela Lei 4.595/64, ressaltando-se que o anatocismo é vedado inclusive para as instituições financeiras e que o STF, na Súmula 596, interpretou de forma iníqua e equivocada o disposto na Lei de Mercado de Capitais, entendendo suprimida a limitação imposta pela Lei de Usura nas operações de instituições financeiras, quando isso fere o princípio constitucional da isonomia e quando a outorga de competência ao Conselho Monetário Nacional para ´limitar´ taxas de juros em casos especiais evidentemente não significa rompimento do teto máximo estabelecido pelo Decreto 22.626/33.

Apenas para ilustrar o entendimento, vale mencionar expressiva decisão do TARGS, assim ementada:

´Ex vi do artigo 1º do Decreto 22.626/33, cumulado com o artigo 1.062 do Código Civil, do inciso IX do artigo 4º da Lei 4.595/64 e do parágrafo 3º do artigo 192 da Constituição Federal, os juros são de 12% ao ano.´

Consta na fundamentação do acórdão (Apelação Cível 192166437):

´Qualquer lei ou afirmação que dissesse que os Bancos não se submetem à Lei de Usura seria ridícula e inconstitucional, pois que atacaria o princípio da Lei Maior, repetido em todas as nossas Cartas, que estabelece que todos são iguais perante a lei (artigo 5º da Constituição Federal).

É desprovida de qualquer fundamentação, e até mesmo inverídica, a afirmação de que a Súmula 121 do STF foi posta abaixo. Primeiro, porque um Tribunal não revoga Súmula de outro. E, segundo, porque o acórdão aludido pelo Banco no bojo do Recurso Especial nº 4.724 tem a seguinte ementa:

Execução. Direito privado. Juros. Anatocismo. Lei especial. Semestralidade. Capitalização mensal vedada. Precedentes. Recurso não conhecido.

I - A capitalização de Juros (juros de juros) é vedada pelo nosso Direito, mesmo quando expressamente convencionada, não tendo sido revogada a regra do artigo 4º do Decreto nº. 22.562/33 pela Lei nº. 4.595/64. O anatocismo, repudiado pelo verbete nº. 121 da Súmula do STF, não guarda relação com o enunciado nº. 596 da mesma Súmula.

II - Mesmo nas hipóteses contempladas em leis especiais, vedada é a capitalização mensal.

Portanto, apesar de dois votos vencidos, o que explana julgado é bem o contrário do afirmado pelo Banco na fl. 36 das contra-razões.´

A Câmara a esses fundamentos, ainda acresce que a argumentação utilizada em contrário à incidência do Decreto 22.626/33 aos contratos bancários, a qual tem como suporte autorização concedida pela Lei 4595/54 ao Conselho Monetário Nacional para regrar matéria relativa a juros bancários, não pode vingar por força do artigo 25 do ADCT que revogou todas as autorizações concedidas a órgãos governamentais para regrarem, através de instrução normativa, matéria da competência do Congresso Nacional.

Ora, legislar sobre juros é da competência do Congresso Nacional, nos termos do artigo 48, XIII da Constituição Federal.

Destarte, se está revogada a Lei 4595/64, no que concerne ao poder normativo concedido ao Conselho Monetário Nacional, não há como fugir-se ä conclusão de que volta a ter incidência aos contratos bancários as disposições da Lei da Usura." TARGS, Ap. Cível 195004204, Rel Juiz Márcio Oliveira Puccina, j. 11.4.96

 

                                      Resta então claríssima a violação por parte do requerido ao limite que a Lei brasileira impôs, mais de uma vez, sobre os juros.

 

                                               A CORREÇÃO MONETÁRIA ILEGAL

 

                                      Ao contrário do juro, que representa rendimento, remuneração do capital, a correção é tão-somente a atualização do poder liberatório da moeda, decorrente do processo inflacionário. No dizer do Ministro Athos Carneiro (RSTJ 33/462), "não é um plus que se adiciona ao crédito, mas um minus que se evita".

 

                                      Conforme o Desembargador Carlos Prudêncio, a correção monetária, então, "não é um acréscimo, mas sim a própria dívida atualizada, retificada na sua expressão monetária; é mero instrumento de atualização da moeda desvalorizada pela inflação. Assim, sendo duas coisas distintas, a correção monetária não atinge nem interfere no juro de 12%. Independentemente de qual seja a inflação mensal, em torno de 1% como atualmente, ou mesmo por volta dos 30% até tempos atrás, os juros jamais poderão ser superiores a 12% ao ano, pois a taxa de juros é a parcela que supera a taxa de inflação do período computado."

 

                                      Tendo baixado a poeira levantada pela polêmica dos índices de correção monetária, ficou uma certeza predominante: a Taxa Referencial não é fator de pura atualização, mas de ganho de capital, através da especulação financeira.

 

                                      Ademais, é necessário que se saliente que o STF, ao apreciar Ação Direta de Inconstitucionalidade dos artigos 18, caput e parágrafo 1º e 4º; 20, 21 e parágrafo único, 234 e parágrafos, 23 e parágrafo único, todos da Lei nº 8.177 de 10/03/91, declarou a inconstitucionalidade da TR, bem como a sua absoluta inaplicabilidade como indexador:

 

"A Taxa Referencial (TR) não é índice de correção monetária, pois, refletindo as variações do custo primário da capitação dos depósitos a prazo fixo, não constituem índice que reflita a variação do pod